Mais que a queda de produção, as seguidas revisões para baixo da safra 2011/2012 revelam que a cadeia produtiva da cana-de-açúcar vive o pior momento dos últimos 11 anos. E a recuperação do setor para atender o descompasso entre demanda e oferta do mercado depende de um novo ciclo de desenvolvimento, semelhante ao ocorrido na década passada, ao custo de R$ 80 bilhões.
Ao contrário da crise de 1999/2000 - quando o setor enfrentava forte desregulamentação e o desafio era conter a oferta por causa da produção excedente e dos preços baixos - desta vez, o problema é oposto. A falta de matéria-prima eleva os preços dos produtos no Brasil e no exterior, colocando em dúvida a capacidade do setor de atender um mercado pressionado pela alta demanda de açúcar e de álcool combustível.
A possível quebra de 8% a 15% na safra de cana e de até 20% na produção de etanol na região Centro-Sul - responsável por 50% da cana e 60% do álcool produzido no país - embora atribuída diretamente ao envelhecimento do canavial, às adversidades climáticas e à queda de qualidade da matéria-prima, é fruto da conjuntura econômica pós-crise de 2008. "Vivemos hoje a soma de todos os males. Houve problemas de clima, de falta de investimento nas plantações e de falta de planejamento. A crise de 2008 não foi uma marola, mas uma onda gigante para surfistas profissionais, que surte até agora seus efeitos", afirma o vice-presidente da Associação Brasileira do Agronegócio (Abag), Luiz Carlos Corrêa de Carvalho.
"Com a crise, os produtores e a indústria ficaram sem recursos para financiar a renovação do canavial", explica Carvalho, também sócio da Consultoria Canaplan, que recentemente divulgou revisão da safra com quebra de 14,38%. Ele lembra que o setor precisaria crescer de 7% a 8% ao ano e construir 15 novas usinas de médio porte por ano até 2020 para abastecer a frota de flex e o crescimento vegetativo 2% do consumo mundial de açúcar.
Representante da União das Indústrias de Cana-de-Açúcar (Unica) em Ribeirão Preto, Sérgio Prado, diz que o setor vinha de um crescimento de 10% ao ano com a instalação de 90 indústrias entre 2003 e 2008, mas que, após a crise de 2008, os investimentos acabaram por falta de crédito. Mesmo assim, a quebra de safra não era esperada. "Ainda em 31 de março de 2011, estimávamos um crescimento de 2% na safra deste ano", diz.
Na sua última revisão, a Unica previu uma queda de safra de 8,4%, de 557 milhões de toneladas de cana da safra passada para 510 milhões para a safra atual. A entidade estima que a produção de álcool hidratado caia em 20% e a de açúcar em 8%. "O problema é que pela primeira vez na história a produtividade da região Centro-Sul será superada pela do Nordeste", diz Carvalho.
"Em 60 anos de atividade, poucas vezes passamos por uma fase tão ruim como essa. Os últimos três anos foram de sofrimento, de total falta de recursos. Com isso, os produtores não cumpriram com suas obrigações com a renovação dos canaviais e não fizeram o manejo adequado", diz o agricultor José Coral, presidente da Cooperativa dos Plantadores de Cana do Estado de São Paulo, entidade que reúne 5 mil fornecedores independentes.
Para Coral, das 43 milhões de toneladas produzidas pelas 22 usinas e 5 mil produtores da região há três anos, a produção cairá, na safra atual, para 32 milhões de toneladas. "Isso demonstra que o desânimo e a falta de investimento no campo vêm caindo faz três safras", explica.
"O lado bom é que esta crise reajustou os preços da cana, melhorando a remuneração, o que dá um ânimo para que os produtores possam renovar os canaviais", diz. Segundo ele, o preço pago aos produtores, em torno de R$ 47,00 a tonelada na safra passada, deverá subir para R$ 65 a R$ 70 a tonelada na safra atual.