Sustentabilidade

O fim da sujeira no cais

<P>Dois portos da Califórnia querem virar um modelo de sustentabilidade com inovações como rebocadores híbridos, caminhões elétricos e legislação para tirar das docas os veículos poluentes.&nbsp; <BR>&nbsp;<BR>Poucas atividades têm potencial de provocar tanta sujeira quanto o movimento por...

Revista Exame
19/01/2009 00:00
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Dois portos da Califórnia querem virar um modelo de sustentabilidade com inovações como rebocadores híbridos, caminhões elétricos e legislação para tirar das docas os veículos poluentes. 
 
Poucas atividades têm potencial de provocar tanta sujeira quanto o movimento portuário. Paira sobre a maior parte dos terminais uma enorme nuvem negra, resultado da queima de toneladas de combustível provocada pelo incessante vai-e-vem de caminhões, navios e outros equipamentos pesados, como guindastes e rebocadores. Os problemas não se limitam à emissão pesada de poluentes na atmosfera. Acidentes provocados por vazamentos de óleo diesel ou de cargas das embarcações são relativamente freqüentes, deixando um rastro de detritos que podem comprometer para sempre o equilíbrio da vida marítima dos locais atingidos. Encontrar soluções para amenizar o impacto ambiental dos trabalhos nas docas não é das tarefas mais simples, pois exige o desenvolvimento de novas tecnologias e mudanças radicais nos procedimentos de embarque e desembarque de cargas, medidas que, em geral, elevam os custos das operações.

As autoridades da cidade de Los Angeles e de Long Beach, na Califórnia, nos Estados Unidos, resolveram enfrentar a questão e lançaram um programa pioneiro nessa área. Ele consiste num investimento de cerca de 2 bilhões de dólares para obter até 2011 uma redução de 45% no volume de emissões de substâncias tóxicas dos portos municipais - o de Los Angeles e de seu vizinho menor, Long Beach. Juntos, eles compõem o quinto complexo portuário mais ativo do mundo, movimentando 260 bilhões de dólares por ano em contêineres. Os terminais também acumulam outros números impressionantes e bem menos lisonjeiros. Esses locais respondem por mais de 20% das emissões de substâncias tóxicas na área de monitoração ambiental, que inclui os condados de Los Angeles, San Bernardino, Riverside e Orange. Suas atividades são mais poluentes do que a queima de combustível da frota de 6 milhões de carros que circulam na região metropolitana de Los Angeles.

Para tentar melhorar a situação, foi lançado no final de 2006 o Plano de Ação para o Ar Limpo, que envolve esforços do setor portuário e dos governos estadual e municipal a fim de desenvolver e implantar tecnologias verdes para economizar combustíveis e reduzir emissões tóxicas. Uma série de inovações tecnológicas está ajudando a tornar mais limpas as cinco maiores fontes de poluição dos portos - navios cargueiros, embarcações de apoio, equipamentos de manejo de carga, caminhões e trens. As principais ações do plano são: instalar redes elétricas nos terminais para que os navios atracados se conectem e possam desligar os motores a diesel; modernizar os guindastes que manejam a carga para reaproveitar parte da energia gasta; substituir os caminhões de transporte de contêineres por veículos mais modernos e menos poluentes; introduzir rebocadores e caminhões híbridos ou elétricos; e incentivar os navios a usar combustível mais limpo e reduzir a velocidade para entrar e sair dos portos, a fim de diminuir as emissões.

Terminais ecológicos

Uma das maiores inovações é o caminhão elétrico, que transporta contêineres em viagens curtas na área portuária sem emitir poluentes. Desenvolvido pela fabricante californiana Balqon com ajuda financeira do porto de Los Angeles, um veículo desse tipo já se encontra trabalhando no lugar em caráter experimental. Até o próximo ano, a idéia é contar com uma frota de 25 unidades em operação. Parece um bom negócio não apenas em termos ambientais. Cada modelo custa 200 000 dólares e representa uma economia de 85% em relação a um equivalente a diesel, que gasta 35 000 dólares por ano em combustível. Mais caro é o sistema de energia marítima alternativa (AMP, na sigla em inglês), que alimenta os navios atracados via rede elétrica. O porto de Long Beach gastou 15 milhões de dólares para eletrificar uma só doca. O de Los Angeles já equipou duas docas e pretende investir 100 milhões de dólares nos próximos quatro anos para adaptar outras 13. O sistema exige a colaboração das transportadoras: ainda existem poucos navios no mundo equipados para se conectar à AMP e o custo estimado para realizar a adaptação é de 1 milhão de dólares. Outra vedete das inovações verdes é o rebocador híbrido. Com investimento de 1 milhão de dólares dos dois portos, a empresa Foss está desenvolvendo o primeiro rebocador com dois motores a diesel, dois geradores e quase 10 toneladas de baterias. O barco, que deve ficar pronto ainda neste ano, custa 8 milhões de dólares. A Foss espera uma economia de 30% de combustível.

Uma das etapas mais importantes - e polêmicas - do plano antipoluição acaba de ser posta em prática: o Programa Caminhão Limpo. Em 1o de outubro, foram banidos 2 000 caminhões de transporte de carga fabricados antes de 1989 - ou seja, sem tecnologias de redução de emissão de poluentes. Até 2012, será proibida a circulação de veículos fora dos padrões mais limpos de emissão, implantados em 2007. Quando for totalmente implementado, o programa terá banido 16 000 caminhões sujos, diminuindo em 80% as emissões tóxicas. O programa inclui subsídios para que as transportadoras ou motoristas só paguem 20% do preço ao comprar caminhões novos, financiados em parte por uma taxa de 35 dólares por contêiner cobrada de importadores e exportadores. As autoridades portuárias também se propõem a adquirir os caminhões fabricados antes de 1989 por 5 000 dólares cada um. Apesar dos incentivos, a medida motiva conflitos. O programa só pôde começar porque um tribunal federal de apelações rejeitou, em 24 de setembro, uma contestação apresentada pelas transportadoras.

A batalha entre interesses ambientais e econômicos também é travada na frente legislativa. Um dia antes de o Programa Caminhão Limpo entrar em vigor, o governador da Califórnia, Arnold Schwarzenegger, vetou um projeto de lei estadual para a cobrança de uma taxa adicional por contêiner nos portos de Los Angeles, Long Beach e Oakland. Os 400 000 dólares arrecadados por ano ajudariam em programas de redução do congestionamento de veículos e instalação de motores menos poluentes em caminhões e trens. Diante da atual crise econômica, é de vital importância que o estado não piore a situação impondo custos adicionais às empresas, disse o governador. Mais de 100 grandes empresas da Califórnia criticaram a medida, entre elas a Coca-Cola. Até a governadora do Alasca e então candidata republicana à vice-Presidência dos Estados Unidos, Sarah Palin, pediu que Schwarzenegger vetasse a lei, argumentando que ela resultaria em aumentos de preços em seu estado, importador de produtos da Ásia via Califórnia.

Os defensores da taxa e de outras medidas respondem com um raciocínio simples: a expansão da atividade portuária, com geração de empregos e crescimento econômico, depende diretamente do sucesso da campanha ambiental. De fato, os portos esperam que o plano antipoluição limpe sua imagem perante a sociedade e os tribunais e abra caminho para uma planejada expansão da infra-estrutura, com investimentos de cerca de 2 bilhões de dólares, a fim de dar conta do aumento do comércio - que, segundo projeções, triplicará até 2020. Considerando o impacto na saúde da população, só poderemos nos expandir se combatermos agora as causas da poluição, afirma a diretora executiva do porto de Los Angeles, Geraldine Knatz. Para o presidente da comissão portuária de Los Angeles, S. David Freeman, o impacto das medidas nos preços ao consumidor será mínimo. O porto é uma das maiores fontes de empregos com remuneração decente na região.

Geraldine Knatz afirmou que as iniciativas de Los Angeles e Long Beach são modelos para o restante dos Estados Unidos - cujos portos já começam a planejar medidas semelhantes - e do mundo. O terminal de Los Angeles já assinou acordos de cooperação em pesquisa e tecnologia com os portos de Xangai, na China, e Roterdã, na Holanda. Ao redor do mundo, os portos adotam ou estudam inovações parecidas de combate à poluição. As docas elétricas, por exemplo, existem também em Gotemburgo, na Suécia, e Zeebrugge, na Bélgica. O Brasil, onde a atividade portuária ainda sofre com gargalos como a falta de infra-estrutura, tem um longo caminho a percorrer para a tecnologia verde. Essa política, infelizmente, ainda está muito fora de nossa realidade, afirma Michel Quirino, proprietário da empresa Mediterranean Logística Aduaneira, que atua na exportação de algodão no porto de Santos. Segundo ele, a maioria dos caminhões que circulam pelo local não tem sequer equipamentos básicos antipoluição, como os catalisadores. Se a legislação californiana fosse implementada aqui, quase nenhum veículo poderia continuar operando.

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