A missão da universidade como catalisadora da inovação e do desenvolvimento está ganhando novos contornos no país a partir de iniciativas como a construção do Parque Científico e Tecnológico da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp), cujas obras de infraestrutura começaram a ser entregues no mês passado. Instalado numa área de 100 mil metros quadrados encravada na Cidade Universitária, o parque vai abrigar laboratórios de inovação em que trabalharão, num mesmo ambiente, pesquisadores das empresas e docentes e estudantes da Unicamp.
O modelo, que só recentemente começou a difundir-se no Brasil mas está presente em várias universidades do mundo, tem o condão de enriquecer a formação de estudantes e o trabalho dos cientistas com as demandas trazidas pelas empresas e multiplicar o investimento em pesquisa nas universidades.
“Os laboratórios na Unicamp produzirão desenvolvimento tecnológico, mas também darão uma contribuição importante para a pesquisa fundamental. Eles darão lastro a teses, dissertações, patentes e publicações de alunos desde a iniciação científica até o pós-doutorado”, diz o reitor da Unicamp, Fernando Ferreira Costa. “Não se trata apenas de prestar serviço ou de resolver problemas, mas de aprimorar a formação dos nossos estudantes, que depois poderão levar essa experiência para fora da universidade, contribuindo para a inovação, o desenvolvimento do país e a formação de empresas de base tecnológica”.
Do lado das empresas, a criação de laboratórios em universidades traz benefícios imediatos, como a possibilidade de usar a expertise de bons pesquisadores em temas sensíveis, e outros de longo prazo, como a chance de interagir com outras empresas e com pesquisadores atuantes no parque, além de recrutar jovens pesquisadores para seus quadros entre estudantes talentosos.
Empresas como a Tecnometal, do setor de mineração e energias renováveis, e a Cameron do Brasil, de tecnologia e serviços para o setor de petróleo e gás, já celebraram convênios para a implantação de laboratórios no campus. O parque também abrigará a Unidade Mista Embrapa Unicamp de Pesquisa em Genômica Aplicada a Mudanças Climáticas, um modelo de parceria inédito para a empresa de pesquisa, na qual pesquisadores das duas instituições trabalharão em busca de variedades agrícolas mais tolerantes aos efeitos do aquecimento global.
Já funciona nos limites do parque o Inovasoft, o Centro de Inovação em Software da Unicamp, que abriga empresas nascentes e laboratórios criados em parceria com a IBM, a Samsung e o Banco do Brasil. E está em construção o prédio do Laboratório de Inovação de Biocombustíveis (LIB), que funcionará num formato semelhante ao do Inovasoft, atraindo laboratórios de empresas.
“A Unicamp tem uma longa história de colaboração com o setor produtivo, e o Parque Científico e Tecnológico vai estabelecer um novo patamar dessa colaboração”, explica Ronaldo Pilli, pró-reitor de Pesquisa da universidade. Há uma regra restrita nas negociações para incorporar novos laboratórios no parque: só são admitidas iniciativas que contemplem convênios com grupos de pesquisa da Unicamp. “O objetivo é fazer pesquisa competitiva. A empresa precisa reconhecer que a Unicamp será um parceiro estratégico”, diz Pilli.
Segundo Roberto de Alencar Lotufo, diretor da Agência de Inovação Inova Unicamp, que articula a negociação com as empresas, o advento do parque permite que a universidade proponha e organize a construção de novos laboratórios colaborativos com empresas.
“Até agora, quando surgia uma oportunidade de se construir um novo laboratório, a sua localização não seguia um planejamento, resultando na instalação de vários prédios espalhados pelo campus”, diz Lotufo. “O Parque Científico e Tecnológico vem organizar e apresentar um planejamento de construção de novos laboratórios de pesquisa colaborativa criando um ambiente sinérgico multidisciplinar. O parque funcionará como um condomínio, no qual as empresas pagam pelo uso do espaço e rateiam despesas com segurança e infraestrutura”.
As empresas participantes do parque utilizam tipos variados de financiamento para construir seus laboratórios. No caso da Cameron do Brasil, isso será feito com recursos da própria empresa - a Unicamp ofereceu isenção de 10 anos da taxa de ocupação em troca da construção do prédio pela companhia.
O convênio foi assinado em 2011 e o laboratório da empresa já deveria estar em construção, mas a Cameron decidiu adiar em um ano sua implantação, por conta da recente retração de investimentos da Petrobras. A parceria envolve uma colaboração com a Faculdade de Engenharia Mecânica (FEM) e o Centro de Estudos de Petróleo (Cepetro) em projetos de pesquisa em equipamentos e processos submarinos para processamento e produção de petróleo, com ênfase na camada pré-sal.
O Cepetro, criado em 1987 em parceria com a Petrobras, ajudou a multiplicar a expertise da Unicamp nas pesquisas em engenharia de petróleo, que agora atraem a atenção de outras empresas. Em 2015, por exemplo, serão concluídas as instalações do Laboratório Experimental para Risers de Produção em Águas Ultra-Profundas e Sistemas Marítimos de Produção (LabRiser), compostas por um tanque experimental único no mundo capaz de simular as condições a que as estruturas submarinas são submetidas na produção de petróleo no oceano, como a força das correntes marinhas.
O tanque de 30 metros de profundidade e o prédio do laboratório custarão R$ 6 milhões e, além disso, haverá maquinário experimental, instrumentos laboratoriais e de análise e equipamentos de computação, patrocinados pela Petrobras.
“Como nosso petróleo se encontra no mar, a Petrobras sempre se preocupou em desenvolver pesquisas sobre a perfuração de poços e produção de petróleo no oceano - e encontrou essa capacitação na Unicamp”, diz Celso Morooka, professor da Faculdade de Engenharia Mecânica e diretor do LabRiser.
Também há parcerias que utilizam mecanismos de financiamento não reembolsável do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES), no âmbito do Fundo Tecnológico (Funtec). Um exemplo é o laboratório de 500 metros quadrados que a Unicamp, em parceria com a Tecnometal, está construindo no parque. O projeto obteve R$ 12 milhões em recursos do Funtec para construção do prédio e compra de equipamentos.
A contrapartida da Tecnometal equivale a 10% do valor do projeto. A empresa tem uma fábrica de painéis fotovoltaicos em Campinas (SP) e já trabalha em conjunto com pesquisadores da Faculdade de Engenharia Mecânica e do Instituto de Física Gleb Wataghin, da Unicamp, em esforços de pesquisa relacionados ao processo de purificação do silício grau metalúrgico, a fabricação de lâminas de silício grau solar e a fabricação de células solares. A Agência Inova Unicamp mantém conversas adiantadas com pelo menos três empresas interessadas em participar do parque utilizando recursos do Funtec.