O ano virou, mas há muita gente que tem considerado janeiro o décimo terceiro mês de 2020. O motivo é simples, o isolamento segue mantido, ou deveria; a economia continua duramente impactada e a saúde pública respirando por aparelhos, literalmente. Entre negacionistas ou defensores ferrenhos da vacinação em massa, críticos da condução de todo este processo de vacinação e negociação de compra dos imunizantes no Brasil e pacientes perdendo vidas sem ar, janeiro, apesar de tudo isso, nos deu um fôlego. A vacina finalmente chegou ao Brasil.
Junto com ela uma série de dúvidas, informações e questionamentos. Estávamos há meses acompanhando esse processo tão inquietos na torcida que o sentimento inicial ficou dividido entre uma leve euforia e determinada apreensão diante de algumas indefinições. E em qualquer lugar que transitemos, em casa, no trabalho ou no grupo de amigos do WhatsApp, não tem jeito, a vacina é pauta certa de muito debate e opiniões divergentes. No meio de tantas perguntas, algo pelo menos já tem resposta imediata, a vacina deverá fazer parte compulsoriamente da agenda de comunicação corporativa do ano, de forma prioritária, desde agora.
Há quem esteja em um debate mais preliminar sobre eficácia e ideologia por trás da vacina, repercussão essa permanente desde meados da pandemia. Minha vó mesmo, Dona Marinalva, de 79 anos, que sempre foi a maior defensora da vacina da gripe para a terceira idade, demonstrou certa insegurança agora na vacinação contra o novo Coronavírus. E a razão não é pequena, ela está com medo de morrer por vacinar-se. A vacina é segura e passou por todos os testes devidos para confirmar sua eficácia, sendo legitimada não apenas pelos laboratórios e institutos que criaram e fizeram sua produção, mas chancelada também pela Anvisa – Agência Nacional de Vigilância Sanitária -, ligada ao Ministério da Saúde. Mas diante de uma infodemia sobre o assunto, cercado por informações nem sempre confiáveis e até mentirosas, mesmo quem está atento e assíduo na cobertura sobre o tema, como minha avó, pode ficar com o pé atrás.
Como tudo o que é novo, conversas mais abrangentes já começaram a emergir com o início da imunização contra a Covid-19 no Brasil: um colaborador pode ser demitido por justa-causa se não quiser se vacinar? A iniciativa privada pode e deve priorizar seus funcionários? Permitir a vacinação privada em um país tão desigual do ponto de vista social como o Brasil é ético? Seria viável para as companhias estender uma possível vacinação a parentes de colaboradores? Perguntas, perguntas, perguntas... muitas delas cujas respostas só aparecerão mesmo de forma pontual e decisória daqui a um, dois meses, ou mais. Mas elas aparecerão e em grande escala.
2020 foi um ano importante para a comunicação corporativa e eu comentei sobre isso aqui mesmo na coluna no ano passado. Quatro pontos são fundamentais para se entender melhor por que a comunicação ganhou força e empoderamento para liderar e conduzir debates que antes talvez ficassem a cargo apenas das áreas de saúde, segurança ou recursos humanos, nesses últimos meses atípicos e são eles que, juntos, vão guiar o cenário dos planos de comunicação em 2021.
• Confiança nas empresas
Em um momento de tantas dúvidas e falta de representatividade popular, cunhado em alguns momentos pela priorização da politização de determinados temas em detrimento da preservação da saúde, a confiança nas instituições, em especial no Governo, ficou abalada. Esta brecha de confiança abriu espaço para que as empresas e marcas assumissem este papel de construir e gerá-la juntamente a seus públicos. Se espera mais das empresas do que do resto da sociedade. E essa expectativa nunca foi tão alta.
• Comunicação corporativa fortalecida e redimensionada
O ano passado foi um divisor de águas para a comunicação corporativa. Ela começa 2021 sendo desafiada a assumir a liderança de debates e ser uma escuta ativa dos anseios dos funcionários e stakeholders externos. Precisará ser ainda mais rápida e proativa, além de estratégica e conciliadora. Afinal ela é, agora mais do que nunca, a engrenagem principal de criação de conteúdo e movimentação da informação correta e oficial pela e para a empresa dentro e fora de seus ambientes.
• ESG ganha espaço
O termo que ganhou o mundo com maior abrangência e destaque no ano passado e que representa em português o trinômio de governança Ambiental, Social e Corporativa, referindo-se diretamente como fatores fundamentais de sustentabilidade e impacto social, agora pode atrair ou afastar investimentos externos e coloca em xeque o papel da iniciativa privada na sua tratativa especialmente socioambiental em vias de fato. Não basta mais só dizer que faz, há a cobrança eminente por um olhar social de comprometimento com os públicos com os quais se relaciona. A comunicação entra como estimuladora de conversas em torno do tema, seja na alta liderança, seja para comunicar e informar sobre abordagens da empresa sobre o tema externamente.
• Cultura do colaborativismo interempresarial/intersetor
Um comportamento que ganhou força com a pandemia e que deve se perpetuar no longo prazo é o trabalho conjunto em prol do bem-estar da grande massa, seja ela de colaboradores, ou da sociedade de modo geral. Ficou claro, seja para somar forças na construção de um hospital de campanha; de alimentar uma ação de doação de alimentos; ou para cocriar lives gratuitas e grupos de WhatsApp multidisciplinares. Empresas, setores e áreas, foram obrigados em 2020 a interagir e se aproximar, inclusive empresas/setores concorrentes. Entendeu-se que esta união amplia o alcance das ações e o retorno é maior e mais consistente.
E é neste cenário, já no primeiro do mês do ano, que a comunicação precisará se desafiar a organizar-se interna e externamente para buscar parceiros, fortalecer e consolidar sua confiança e transparência, apropriar-se do seu protagonismo, além de manter o ritmo e criatividade, priorizando e entendendo-se como importante veículo em permanente trânsito de informações entre pessoas, sociedade e meio ambiente em prol de uma conduta informativa de apoio à ciência e incentivo a imunização contra a Covid-19. Trata-se de um pontapé inicial do ano responsável por contribuir para que o respiro da chegada da vacina e da maior proximidade do fim do isolamento social não se transformem, pelo menos no Brasil, em uma grande frustração coletiva, impactando ainda mais na saúde mental dos trabalhadores, na produtividade e no engajamento empresa-funcionário. Esquivar-se do tema pode ser um erro fatal para o negócio.
Sobre a coluna:
Os textos publicados abordam temas gerais da comunicação organizacional interna e externa; relacionamento com imprensa; redes sociais e marketing digital; reputação e imagem e assuntos de discussão mais recente como cultura e marca; propósito e employer branding.
O novo espaço é editado por Lia Medeiros (foto), diretora de Comunicação, Sustentabilidade e Pessoas da TN Petróleo, e assinado pelo jornalista André Luiz Barros, que há 12 anos trabalha com comunicação corporativa e atualmente acumula o cargo de gerente de comunicação em uma empresa do setor de óleo e gás.
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